sábado, 10 de julho de 2010

Adeus, Bil´in habibti

por Arturo Hartmann

Bil´in é uma vila conhecida em todo o mundo, pelo menos por aqueles que se interessam pelo conflito na Palestina. Ela acabou tornando-se o símbolo de muitas lutas, de muitas opressões. Ela foi um dos hotspots para o ativismo internacional na Palestina, é hoje o modelo que muitas outras vilas seguem quando querem montar suas demonstrações, com gritos, bandeiras e manifestações pacíficas.

A vila está nos arredores de Ramallah. Perdeu suas terras para o assentamento ilegal de Modi´in Illit e está no caminho da rodovia 443, em Território Palestino, mas proibida aos palestinos. Serve como caminho a Jerusalém e Tel Aviv para os colonos na Cisjordânia. Há seis anos, seus moradores levantaram-se dos escombros da Segunda Intifada e começaram a marchar pela via do que chamam de resistência pacífica. Após tentarem as armas na Segunda Intifada - um desastre, foram massacrados - voltaram-se às bandeiras e ideias bem-humoradas.

Através de um contato em Ramallah, conheci um dos moradores desta vila. Aqui, uma caminhada mostra a vida rural, rebanhos, criações de galinha e plantações. No mais, calmaria, um clima enfadonho, de tardes em que nada acontece, tardes que moradores de grandes cidades não conseguem apreciar.

No entanto, todas as sextas, há seis anos, parte dos moradores desta vila, acompanhados de estrangeiros (ou internacionais, como são conhecidos) e ativistas israelenses, marcham para encontrar o posto do exército israelense. Um encontro marcado, um baile de dança que inclui bombas de gás, de percussão, armas de contenção de manifestações. Toda sexta, os moradores acham um tema, o filme Avatar, a colheita das oliveiras, o início da Copa do Mundo ou o aniversário de cino anos da decisão da Corte Internacional de Justiça da ONU que decidiu pela ilegalidade do Muro que Israel levantava (era 2004) e agora está em parte terminado nos Territórios da Cisjordânia. Toda sexta lembram que tiveram algo tomado, que há algo aqui que chamam de ocupação.

Foi a última sexta para mim. Após noites de chá e narguilê e tardes de churrasco, dava adeus. Para eles, no entanto, as sextas não têm fim. Parece ser o destino desta vila marchar, bradar conquistas mas não ver o Muro andar um centímetro em direção à linha-verde, a fronteira de Israel com o que insistimos de chamar de Palestina.

chuva de pedras
foto: José Menezes

Na última sexta, os jovens ousaram. Pegaram pedras, estavam face a face com os soldados com o escudo, menos de dois metros os separavam. Ao longe, conseguíamos ouvir as pedras do chão da Palestina batendo contra o escudo do exército israelense. Mais uma ironia. O mundo deu voltas. A Primeira Intifada, o levante popular de uma população cansada - a OLP já não oferecia nada - e desarmada - por isso a Intifada das pedras - voltava como um clipe do passado. Não parecia realidade. Era um holograma. Na manifestação pacífica, que procura recolher os cacos após a destruição da Intifada das armas, voltávamos aos anos 80, quando Arafat estava vivo, quando Oslo era apenas a capital da Noruega e não de mais uma tragédia palestina e o Hamas nem sequer fazia parte da arena deste conflito.

garoto foge das bombas de gás em Bi'lin
foto: José Menezes

Muitos crimes estavam sendo cometidos naquela tarde em Bil´in. Os jovens da vila, aclamados e aplaudidos por estrangeiros que em alguns dias pegariam seus voos em Tel Aviv, não teriam uma noite tranquila. Jogar pedras é crime pela lei militar de Israel e missões do exército e do serviço secreto podem ocorrer na calada da noite. Meninos de 16 anos podem conhecer a cadeia cedo. Do outro lado, soldados defendiam um Muro considerado ilegal. Atrás de trincheiras de concreto, com seus uniformes sob o escaldante sol de verão, defendiam o assentamento que tinham às costas.

Em dias, parto desta terra, volto à nossa "democracia racial". Eles continuam com a "ocupação". Toda a sexta, a dança irá se repetir. Adeus, Bil´in.

Um comentário:

  1. Arturo,

    Li todos seus "posts", acho que essa viagem mudará a cabeça da equipe e mudará a de outras pessoas também (como eu). É um assunto polêmico. Estou ansiosa para ver o documentário e saber os detalhes dessa viagem que parece uma eternidade para quem está aqui na "América do Sul".
    O jantar acontecerá regado a vinho com certeza, e que vocês tomam por ai? Cerveja, coca-cola, chás...????
    abraços, Malu

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