quinta-feira, 1 de julho de 2010

“Você quer ver Israel?”

Por Arturo Hartmann

Dia sem jogo. De fato há um clima e espera pelas próximas fases da Copa. As fases finais. A cisão parece ficar clara e aumenta cada vez mais a divisão entre... Brasil e Argentina. O futebol chegará às suas mesas finais de negociação, se me permitem a brincadeira. Mas nosso trabalho continua, afinal viemos também olhar para as barreiras que existem neste lugar. E mais um dia parte da equipe passa em Hebron. Convencemo-nos de que este lugar é um dos centros que representa o que viemos retratar.

Mas os dias podem ficar enfadonhos. Mesmo a jornalistas que são obcecados pela notícia, em alguns momentos o cansaço vence a busca pela notícia. Mesmo em um lugar como este. Andávamos pelos corredores da cidade velha de Hebron, já início da noite. Os garotos jogavam bola, estão sem aulas, tempos de se divertir. Mesmo nesta parte chamada "cidade fantasma" de Hebron. É pavoroso como podemos nos acostumar como certas situações e aprendermos a nos mexer mesmo pela falta de liberdade.

Alguns meninos da cidade fantasma
foto: Lucas Justiniano


Um menino nos chama. Há dias ele quer nos mostrar algo. Sempre estamos ocupados com outra coisa. Sempre ignoramos seus pedidos. São crianças, por vezes nos encantam, mas por vezes as ignoramos. Era o fim do dia. Decido segui-lo. Ele repetia: “você quer ver Israel?”. No dia anterior, uma garota nos havia perguntado a mesma coisa. “Você quer ver Israel?”. Ambos seguem o mesmo ritual, nos levam até o teto de suas casas e apontam para a construção ao lado, para a rua abaixo. Ali é um assentamento israelense dentro da cidade de Hebron. Ali, é Israel.

As crianças têm um senso de realidade enorme, não tem malícia para mentir. Nem mesmo para si. Aquela frase daria calafrios ao mais nacionalista dos palestinos. Podemos chamar aquela terra de qualquer coisa, de Territórios Ocupados, de assentamentos, de Palestina ocupada, mas a realidade é uma só, algo que só a dureza do dia-a-dia que destrói sonhos ou a inocência de quem pouco entende as coisas pode revelar ou manifestar. Sim, aquilo, no final do dia, é Israel.

O garoto mostra pedras que os colonos jogam, pede que tiremos fotos. Com certeza foi algo que aprendeu com a família, chamar estrangeiros e mostrar a ocupação. Acho difícil acreditar que ele saiba que lá fora há uma comunidade internacional que possa ajudá-lo. Mas não subestime os palestinos, eles envelhecem muito rápido. Aprendem rápido a vida que há décadas levam. Estar aqui é ter a chance de ver absurdos como o de Hebron, da arquitetura deste conflito. Somos estrangeiros que ficaremos por pouco tempo, não podem perder a chance de nos explicar o inexplicável. “Você quer ver Israel?”

2 comentários:

  1. João Carlos Assumpção6 de julho de 2010 às 20:16

    Um texto como este não pode ficar sem comentários. E uma foto como esta, Lucas, também não. Muito legal o trabalho de vocês em Hebron. Abração do amigo Lalo

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  2. Gênero,número e grau em concordância com o Lalo.Fantástica foto,ótimo texto.Alguns tolos em todos os lados....muitos sofrendo no lado palestino.

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