sexta-feira, 25 de junho de 2010

Mais um dia em Hebron*

por Arturo Hartmann

*atualizado às 20h36

Esta cidade marcou minha primeira passagem por Israel/Palestina. Hebron é o absurdo, o cotidiano da ocupação. A equipe conversava com um palestino dono de loja dentro de H2, a parte da cidade controlada pelos israelenses e onde vivem os colonos. Ele está na encruzilhada que marca a ocupação de Hebron.

Observamos então um movimento anormal. Muitos coletes "Press" desciam a esplanada que separa a entrada da Mesquita de Abraão da rua Shuhada. Mudavam o dia-a-dia daquela parte silenciosa, deserta, fanstasma da cidade. Ali, apenas os judeus israelenses podem circular livremente. E os ocasionais estrangeiros.


membros do Knesset andam pelas ruas de Hebron
foto: José Menezes

Sabemos então que um grupo de 4 memebros árabes (os árabe-israelenses, ou os palestinos de 48, depende a quem se pergunta) do Knesset israelense irão caminhar pela rua Shuhada guiados por membros do Breaking the Silence, uma organização de ex-soldados que reportam os abusos do exército israelense na ocupação de Hebron. (*correção: os 4 membros do Knesset que caminharam pela rua Shuhada eram todos do partido Hadash de Israel, o partido comunista. 3 destes membros eram árabes e um deles era judeu). Eles apontavam para as lojas trancadas, as estrelas de David pichadas onde antes era a morada e o sustento de palestinos.

O conjunto todo protestava contra uma decisão da polícia de Hebron - a israelense - de que agora nem mesmo os árabe-israelenses - que são teoricamente cidadãos de Israel - podem caminhar por esta rua desde 1994, fechada após o massacre Goldstein na mesquita de Abraão. Como deputados, não poderiam ser barrados pela polícia, ganham imunidade.

Mas o conjunto de deputados e ex-soldados não caminhava sozinho. Os moradores decidiram protestar. Os colonos bradavam gritos Um alto-falante portátil, um microfone e algumas ideias religiosas. Para eles, não há abusos na força policial e militar que permite o cotidiano de cerca de 500 colonos. Em meio a uma cidade dentro do que em geral é aceito como Território Palestino. A manutenção da ocupação é legítima para eles, é dever do Estado que lhes concede subsídios para viver fora de Israel.

judeu ortodoxo morador de Hebron confronta
judeu israelense membro do Breaking the Silence
foto: Lucas Justiniano

"Terroristas", "Voltem para o Marmara", dizem aos palestinos. "Traidores", "A mãe de vocês....", gritam aos israelenses do Breaking the Silence. Nossa equipe também recebe alguns "elogios". Um garoto grita para José de Menezes: "Você é merda, cheira a merda, veio da merda".

judeu grita sarcasticamente "Shalom"
foto: José Menezes

Mas um dos colonos foi símbolo do que se observa por aqui. Ele gritava "Shalom", num tom jocoso. Um tom jocoso que deve ser universal. Eu o observava. Ele tomou a atitude menos cínica possível. Zombou da paz. Este parece ser um hábito comum por aqui, zombar da paz, seja nas altas esferas de governo ou em uma caminhada rotineira pelas ruas fechadas a palestinos de Hebron.

Welcome, welcome, gritam os garotos palestinos quando voltamos ao mercado da cidade velha. Eles vendem as pulseiras com o desenho da bandeira palestina que Oslo permitiu que tremulasse em alguns pontos da Cisjordânia e Gaza. Na esteira, veio o Acordo de Hebron, que desenhou esta arquitetura de segregação. Welcome, welcome. Bem-vindos à Hebron.

11 comentários:

  1. João Carlos Assumpção25 de junho de 2010 às 14:44

    Para vocês verem como tudo isso é insano. O ponto que mais me tocou foi quando você cita que o Zé (Teles de Menezes) foi hostilizado por um garoto. Até ele? O Zé, além de ser um tremendo profissional, neste caso isso é o menos importante, é uma das figuras mais bacanas que conheci, um sujeito sensacional, apolítico, amigo, gente fina pacas... E é xingado. Fico até sem ter o que dizer... Mas depois ainda vou postar duas coisas, um texto sobre literatura e a crise no Oriente Mèdio, outro sobre a torcida e a empatia que temos pelo mais fraco, um texto com uma pitada de política e futebol. Só que não agora. Hoje é dia de Brasil!!! Abs. a todos, Lalo

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  2. Arturo, clima de velório no Brasil. Seleçãozinha danada, parece a de 90. Nem tem elenco, não tem reserva, não tem criatividade, não tem nada. Tá todo mundo por aqui com cara de que a Copa já era. Não temos time para enfrentar uma Argentina. Seria melhor cair fora logo, como Itália e França. Fica meu desabafo. André

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  3. Uma curiosidade diante deste futebolzinho. O clima aí na Palestina e em israel é de derrota? O que estão falando do Brasil? Que já era? Pra mim já era. André

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  4. Oi André, o pessoal aqui torce para o Brasil, mas desde o início da Copa reclama do Dunga, da falta de Ronaldinho, Adriano, Ganso (sim, eles conhecem o Santos)... enfim, como aé. Quanto a ganhar ou não a Copa, a maioria continua otimista. Nós, do grupo, nem tanto.

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  5. Oi pessoal, obrigado por terem respondido sobre o clima daí. O daqui tá muito ruim, sinto todo mundo com a cara no chão, não tem muito jeito este time, você no rosto das pessoas o clima de já era. Parabéns pelo trbalho de voc\ês todos. André

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  6. O asterisco, Arturo, é porque você colocou umas fotos e mudou o texto? Porque tenho quase a convicção de que havia lido limpeze ética de Israel na primeira versão. Você decidiu tirar este termo? Por quê? Quero entender melhor o que aconteceu para você mudar o texto e, apesar disso, dizer que fico contente em ver que está novamente dando suas impressões sobre o que está vendo aí, mesmo que não sejam impressões isentas, porque objetividade como não canso de escrever não existe. Objetividade absoluta não existe mesmo. Fabio Cohen

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  7. Olá, Fábio,

    Não, o asterisco coloquei porque havia dado uma informação errada, de que os 4 membros do Knesset que caminharam por Hebron eram árabes. Um deles era judeu e todos membros do Hadash (partido comunista). O termo a que você se refere é "limpeza étnica". Ele continua lá, mas não neste post, está no que tem como título "O time do campo". Limpeza étnica foi um termo consagrado pelo historiador israelense Illan Pappe. Ele escreveu, inclusive, um livro chamado "Limpeza étnica da Palestina", um estudo que fez sobre o que aconteceu em 1948, tradicionalmente conhecido como a Independência de Israel.

    Estudos históricos estão aí para serem refutados, mas ele ficou conhecido por corroborar relatos da história oral feita com palestinos junto a arquivos secretos que foram abertos pelo governo israelense, que incluíam cartas e reuniões de líderes sionistas mesmo antes de 1948. Não vou aqui fazer o resumo da obra, pois poderia ser leviano. Recomendo, no entanto, sua leitura.

    Meus relatos e impressões estão aqui para serem criticados, pois continue acompanhando nosso blog.

    Um grande abraço
    Arturo Hartmann

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  8. João Carlos Assumpção25 de junho de 2010 às 21:35

    Zé e Lucas, as fotos de vocês estão mais uma vez SENSACIONAIS!!! Casam bem com o texto do Arturo e dá pra todo mundo sentir o que vocês viram e passaram em Hebron.
    Já sobre a seleção, André, também fiquei preocupado com o que vi... Mas acho que o time lembra mais o de 94 do que o de 90. Só que agora, ao invés de dependermos de Bebeto e Romário, dependemos de Robinho e Kaká. E do Júlio César, claro, assim como dependíamos também do Taffarel em 94. Agora se vamos ser campeões ou não, não tenho ideia. Parece difícil, mas... Abs. do João Carlos

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  9. Prezado Arturo,
    Por um descuido de digitação escrevi "limpeza étnica" de maneira equivocada. Me penitencio aqui.
    O historiador que você menciona não é o único a usar a expressão acima, que abomina por uma gama enorme de razões.
    Você, porém, ganhou meu respeito pela humildade demonstrada e pela resposta que me deu. Deu-se ao trabalho de me responder mesmo tendo outras coisas a fazer aí, em dia de jogo do Brasil.
    Fico agradecido e sinto-me lisonjeado. Sabia que havia lido esta expressão "limpeza étnica" em algum canto, embora não encontrasse em qual, são tantos os textos.
    Isso mostra que acompanho e leio todos os textos que vocês têm escrito e peço para continuar pondo suas colocações e ponderações. Embora não concorde em muitas ocasiões, elas são importantes como tema de reflexão.
    Se não estou equivocado foi o João quem fez uma defesa sua num ataque que sofreu de um internauta que escreve mal e se escondeu como "anônimo", penso como ele (o João, não o internauta). No meu caso, você não tem a minha amizade, porque não o conheço, porém conquistou o meu respeito. Continue escrevendo e fique ciente de que continuarei acompanhando o blog, Fabio Cohen

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  10. João Carlos Assumpção26 de junho de 2010 às 17:47

    Fábio, não sou historiador como são Arturo (é também jornalista) e Lucas, mas tendo a concordar com você. O termo limpeza étnica considero forte demais e não concordo com ele nem com sua utilização, embora vá ler o livro que o Arturo recomendou. Temos de conhecer todos os lados. O legal é que você, pelo visto, também pensa assim e gostei quando escreveu que respeita o Arturo. Pois temos que respeitar o próximo para dialogar. Concordar ou discordar, como ele mesmo escreveu. Está dando a cara para bater. Como eu, como você, que se identifica quando escreve.
    Enfim, a questão de 1948 é complexa e acho que grande parte da responsabilidade por tudo o que aconteceu cabe aos europeus, como no caso da África, e não aos judeus que foram morar em Israel, incentivados pelos primeiros. Quando os países foram se tornando independentes, as divisões e os estragos feitos pelos colonizadores europeus estavam lá e continuam até hoje.
    De resto, estou feliz com o primeiro tempo do Uruguai. Espero que siga assim no segundo.
    Abs. João Carlos

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  11. Você falou do Robinho, do Kaká e do Julio Cesar e simplesmente se esqueceu do Luís Fabiano, o Fabuloso.

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