quinta-feira, 17 de junho de 2010

Os muitos conflitos desta “terra santa”

por Arturo Hartmann

Jerusalém hoje acordou parada, mas não em silêncio. Segundo números oficiais, até 100 mil judeus ortodoxos ashkenazis foram às ruas manifestar seu repúdio à decisão da Corte de Justiça que proíbe que separem seus filhos de estudar de sefaradim, que segundo eles não teriam os mesmos costumes estritos religiosos.

O debate começou semana passada. O Jerusalem Post, em sua versão inglês, trazia uma matéria especial sobre o conflito que havia numa escola para garotas no assentamento de Immanuel, que fica em território palestino da Cisjordânia. Ali, as garotas sefaradim (judeus vindos do Oriente Médio) chamavam as ashkenazis (originados do Leste europeu) de ashke-naziots. A resposta era algo como sefaradim-baratas, em hebraico.

O debate, incluída aí a manifestação de hoje, foi uma exacerbação do que é visto como uma hierarquização mesmo entre as comunidades judaicas dentro de Israel. A mobilização foi enorme e expõe a importância e o tamanho das comunidades religiosas ortodoxas dentro do país, que muitas vezes se chocam com o conceito de democracia que Israel diz ter. Há liberdade para defender uma posição, mas neste caso de uma posição segregacionista, como noticiou o Haaretz.

Enquanto andávamos pelo centro de Jerusalém e íamos em direção a mais um dia de filmagem (vimos o jogo da Argentina X Coreia do Sul com um grupo de argentinos migrados há cerca de dois anos), pegamos um táxi com um palestino de Jerusalém Leste. O cenário era de ruas fechadas e a polícia atenta para uma nova investida dos manifestantes.

Argentinos assistem ao jogo.
foto: José Menezes


O palestino entrou na conversa e tentou contar um pouco da história da cidade que também é sua. Pergunto se os palestinos têm alguma convivência com esses judeus (os sefaradins) que na teoria são árabes. Diz que não, que eles os tratam igual os ashkenazis, narizes empinados. Mas admite que dentro da comunidade judaica, enxerga uma hierarquia, que a elite política é ashkenazi, que os melhores empregos, em sua maioria, ficam com eles também. E os palestinos? A eles não sobra nada, são a última escala de Jerusalém. Alguns judeus – de qualquer origem – quando chamam o táxi mas percebem que o motorista é palestino, desistem e esperam o próximo. Mas ele não se importa. É seu cotidiano.

Mais uma aula sobre os muitos conflitos deste Estado chamado Israel. Bastou uma tarde.

7 comentários:

  1. Meu, o que vc tem contra o estado de Israel? Se tem tanta raiva assim o que está fazendo aí? Muita ironia da sua parte e muito mal gosto chamar Jerusalém de "terra santa".

    ResponderExcluir
  2. João Carlos Assumpção18 de junho de 2010 às 05:35

    Sem ter consultado o Arturo, como amigo e colega de trabalho dele, queria fazer algumas considerações sobre o comentário de quem "assinou" como Anônimo, o que faz parte do jogo. O Arturo tem todo o direito de colocar suas opiniões, de estar em Israel e de comentar o que está vendo e sentindo.
    Concordo com ele? Não em diversos pontos, em outros sim, mas como disse somos um grupo heterogêneo, cada um pensa de um jeito, o que é bacana _se todos pensassem da mesma forma é que a coisa seria enfadonha.
    Se você é favorável ao diálogo e eu espero que seja, tem que aceitar opiniões diferentes das suas.
    O Arturo fez um texto com o olhar de observador dele, que não é o mesmo que o meu, por exemplo. Mas que deve ser respeitado, como gostaria que respeitassem o meu.
    Mesmo num jogo de futebol _e daí a importância de um documentário como o nosso_ o olhar do observador varia. O Lucas e o Zé não gostaram do Brasil, eu gostei. O Antero Greco, do Estadão, considerou o pior jogo da Copa até agora França e Uruguai, um jogo do qual gostei. Vimos com olhos diferentes. E é essa a graça da vida.
    Abs. João Carlos

    ResponderExcluir
  3. Meu caro Anônimo,

    De forma alguma tenho ódio ao Estado de Israel. Tenho muitas críticas às políticas governamentais e a aspectos de sua formação social. Mas críticas não significam ódio. Tenho muitas críticas, por exemplo, à formação social brasileira, à desigualdade que tem sem dúvida embutida em si um aspecto étnico que foi construído no decorrer de nossa história. Mas as inúmeras críticas que eu possa fazer às políticas de Estado brasileiras não significam que tenho ódio ao Estado do Brasil.

    Quanto à sua pergunta de por que estou em Israel, bom, sou jornalista, e tenho interesse pelo assunto. No exercício de jornalista, não inventei nada. Apenas fiz o relato do tema que mais divide os debates públicos aqui em Israel neste dia. Como deve ter visto, citei a cobertura de importantes jornais locais. O “terra santa”, entre aspas, foi sim uma ironia, mas em nada carregada de ódio. Ali, apenas uma forma de destacar os debate de formação da identidade deste país, no interior do qual, exatamente como mostraram as manifestações de hoje em Jerusalém, o tema da religião é candente. Faz parte da arena pública.

    Como esta na descrição deste blog, vim aqui fazer um documentário como parte de uma equipe. Também como já foi exposto aqui, somos cinco amigos que decidiram o assunto ser interessante o suficiente para fazermos um trabalho em Israel/Palestina. E como também já foi debatido em posts anteriores, o fato de sermos amigos não significa que pensemos da mesma forma. E como diz acima meu colega/amigo João Carlos Assumpção, e concordo, acredito que a força deste documentário virá exatamente das diferentes visões que cada um de nós tem e dos diferentes aspectos que cada um de nós pode trazer para esta história.

    E nossos posts estão abertos a críticas como a que você acaba de fazer. Ótimo você acompanhar e exprimir suas opiniões.

    Um grande abraço
    Arturo Hartmann

    ResponderExcluir
  4. Arturo Hartmann parabéns pela bela resposta. João parabéns por apoiar um companheiro de trabalho que apenas está colocando suas posições. Vocês dois formam uma boa dupla, desconsiderem o que escreveu esse "anônimo". Abraços do Rafael

    ResponderExcluir
  5. Responderam, respeito. Mas é um direito meu escrever como "anônimo", vocês dão esse direito no blog, portanto os dois não ironizem esse fato. É ridícula essa ironia, como continuo achando ridícula o Arturo escrever "terra santa". Com minúscula e com falta de respeito.

    ResponderExcluir
  6. Meu caro,

    Sua opinião fica aqui registrada. E não houve qualquer intenção de ironizar o "Anônimo". De fato permitimos e é um direto seu.

    Um grande abraço
    Arturo Hartmann

    ResponderExcluir
  7. Até agora não entendi. Qual o problema de chamar "terra santa"?

    Francisco Carlos Pessoa Faria Junior

    ResponderExcluir